A nuvem de gafanhotos que invadiu o Brasil

Nas últimas semanas um assunto tomou conta dos meios de comunicação, dividindo os holofotes com o agravamento da pandemia do Corona vírus e as polêmicas da nossa política.

Uma nuvem de gafanhotos oriunda da Argentina estaria vindo em direção ao Brasil, em especial ao sul do país. Não demorou muito e uma onda de desespero, memes e brincadeiras sobre o assunto tomaram conta das redes sociais.

• Sinal do fim do mundo?
• Uma das pregas do Egito?
• Praga divina?
• Vingança da natureza?

Afinal, o que é uma nuvem de gafanhotos e qual o real problema dessa ameaça para nós?

Confira este post até o final que vou contar tudo o que descobri para você.

Mas antes, um recadinho rápido para você. Se você curte o nosso trabalho, seja um apoiador do Jardim, com apenas R$5,00 mensais você nos ajuda a continuar com este projeto. Acesse: https://www.catarse.me/criandoumjardim e saiba como.

Quem acompanha o Jardim há algum tempo sabe que eu sou bióloga, com mestrado e doutorado em biologia, porém ao longo da minha formação trabalhei muito pouco na área entomológica (estudo de insetos), por isso fiz uma boa pesquisa sobre o assunto para trazer para vocês informações corretas, e não difundir mais fake news como andou acontecendo na internet.

Se você que é da área entomológica sabe de mais alguma informação sobre o assunto, compartilhe conosco nos comentários!

Bom, para começar, o que são Gafanhotos?

Segundo o livro Entomologia Didática de Zundir Buzzi (2002), gafanhotos são animais pertencentes ao Filo Arthropoda, Classe Insecta, Ordem Orthoptera. (Calma, já acaba o biologuês) A ordem Orthoptera geralmente é dividida em duas subordens: Ensifera e Caelifera.

Até a publicação do volume do livro do Buzzi que eu possuo, eram conhecidas cerca de vinte mil espécies para a Ordem, sendo a família dos gafanhotos a maior, com cerca de dez mil espécies, ocorrendo em todo o mundo, porém com uma distribuição maior nos trópicos.

Mas não pense que só de gafanhotos vivem nessa Ordem, os grilos, esperanças, manes-magros, paquinhas, etc. também pertence aos Orthopteros.

A principal característica desses animais é o aparelho bucal mastigador, as asas que podem ser tanto ausentes como presentes e as pernas posteriores do tipo saltatório.

A maioria das espécies dessa ordem são onívoros, ou seja, se alimentam de diversas fontes diferentes, sendo alguns carnívoros, porém a maioria é fitófaga, e aí que está o problema para nós, quando o assunto é uma nuvem de gafanhotos.

Porém, uma coisa que tem que ficar clara, existem muitas espécies de gafanhotos, e a grande maioria delas não são consideradas pragas. Então muito cuidado em generalizar e sair matando os pobres bichinhos, eles tem uma importância ecológica enorme que irei contar no final deste post.

Como os gafanhotos são insetos, eles tem o corpo dividido em três partes (cabeça, tórax e abdômen), com três pares de pernas e um par de antenas.

Possuem um exoesqueleto de quitina, e a maioria das espécies possui dois pares de asas. Durante o processo de desenvolvimento do gafanhoto, ele passa pela fase de ninfa, a qual não tem assas. Somente gafanhotos adultos e maduros sexualmente podem apresentar asas.

Alguns gafanhotos são considerados pragas agrícolas em função de se alimentarem de plantas, um gafanhoto pode consumir o seu peso em um dia. Confira o post sobre pragas da horta para aprender uns truques que irão espantar esses gulosos do seu jardim.

Como se forma uma nuvem de gafanhotos?

Algumas espécies de gafanhotos possuem um hábito chamado de Gregário, ou seja, se juntam em grupos, no caso a nuvem de gafanhotos. Esses grupos se deslocam procurando alimento e lugares para reprodução. Como o alimento do gafanhoto são os vegetais, plantações são, literalmente, o prato cheio para essas nuvens se instalarem e fazerem a festa.

Porém com falei anteriormente, nem todas as espécies tem esse hábito e muito menos são consideradas pragas, não podemos generalizar, ok!

Essas nuvens se deslocam para outra fonte de alimento assim que exaurem a anterior, e na falta de inimigos naturais, essas nuvens tendem a aumentar e provocarem um estrago cada vez maior.

E quais são os inimigos naturais dos gafanhotos?

Muitos vertebrados e até invertebrados são os arqui-inimigos dos gafanhotos. Várias espécies de aves possuem como prato principal o gafanhoto, já dentre os invertebrados, espécies de Himenópteros e Dípteros também apreciam muito essa iguaria saltitante.

E para que servem afinal esses bichos?

Essa pergunta é super corriqueira, e o terror dos biólogos, afinal todos os organismos que existem possuem uma importância ecológica bem definida e, quando essa importância não está diretamente ligada ao dinheiro, normalmente é considerada uma espécie desnecessária para o planeta.

Acredito que você que acompanha o Jardim não tem esse tipo de pensamento, se tiver ta na hora de mudar, afinal o que rege o mundo não é o dinheiro!

Mas vamos lá, como falei os gafanhotos são pragas agrícola muito nocivas, atacando principalmente culturas de milho, pastagens, folhosas e hortaliças.

Porém são fundamentais ecologicamente, sendo a base da cadeia alimentar de muitos animais, como os que comentei anteriormente e até de répteis e anfíbios.

E como está a situação da nuvem de gafanhotos aqui no Brasil?

Não é de agora que esse fenômeno acontece, infestações de nuvens de gafanhotos na Argentina, Brasil e Uruguai são relatadas desde 1640, porém a partir de 1905 os relatos foram mais recorrentes aqui no sul do Brasil.

As últimas notícias que encontrei (link nas referências) relatam que a nuvem está pousada na Argentina, bem próximo da fronteira com o Brasil, porém o frio se tornou um fator limitante para a expansão desses animais.

Com a queda brusca que tivemos nesta última semana, os gafanhotos diminuíram o metabolismo e pousaram, esperando um aumento da temperatura, o qual aumenta o seu metabolismo.

Mas o alerta continua aqui no Brasil quanto à vinda deles para cá.

Ou seja, essa nuvem ainda não chegou ao Brasil, porém com tudo o que vem acontecendo no nosso país e, ainda por cima um momento de pandemia como o que estamos vivendo, tornaram um fenômeno recorrente algo com proporções épicas, o que gerou pânico e uma disseminação de notícias e informações equivocadas sobre o fenômeno e a espécie.

Para finalizar este post, que ficou um pouco longo, quero ressaltar a importância da preservação e do equilíbrio natural. Tudo é ligado na natureza, e não podemos esquecer nunca disso, ainda mais quando queremos ter um jardim lindo e florido.

Não saia matando gafanhotos no seu jardim por medo e desconhecimento. Pesquise em sites confiáveis e se informe sempre.

Espero ter esclarecido algumas dúvidas neste post. Deixe nos comentários a sua opinião.

Até mais!

Referências:

• Buzzi, Z. J., & Miyazaki, R. D. (2002). Entomologia didática. Curitiba: editora UFPR.
• Gafanhotos. Disponível em: encurtador.com.br/xFIN4
• Fernandes, V. D., & Pádua, J. A. A Praga de Gafanhotos no Sul da América: Argentina, Brasil e Uruguai (1890-1950).
• Na Argentina, clima prejudica busca por gafanhotos pelo segundo dia. Disponível em: https://www.canalrural.com.br/agronegocio/na-argentina-clima-prejudica-busca-por-gafanhotos-pelo-segundo-dia/